O Plâncton Eólico


Cada dia me convenço mais que o universo da biologia não se constitui meramente de ciência. Se prestarmos um pouco de atenção vamos comprovar que há muita poesia escondida nos relatos científicos. Isso é o que vamos constatar agora lendo um trecho do livro "Diversidade da Vida", de Edward O. Wilson, professor de biologia evolucionista e curador de entomologia do Museu de Zoologia Comparada da Universidade de Havard (E.U.A). No capítulo dois, Wilson menciona o plâncton eólico  como um elemento fundamental para a colonização da ilha de Krakatau, localizada no mar de Java. Krakatau, antes chamada equivocadamente de Krakatoa, desapareceu em 27 de agosto de 1883 em virtude de uma série de erupções vulcânicas. Rakata, uma montanha coberta de cinzas da antiga Krakatau, sobreviveu como uma ilha estéril. Mas a vida logo começou a surgir novamente, oferecendo aos biólogos a oportunidade única de observar a formação de um ecossistema tropical desde o princípio. Seriam os organismos diferentes daqueles que existiam antes? Uma floresta tropical voltaria um dia cobrir a ilha?
A primeira busca de vida em Rakata foi realizada por uma expedição francesa em maio de 1884, nove meses após as explosões que despedeçaram a ilha. Tendo saído especificamente à cata de organismos, o naturalista do navio escreveu que, "apesar de todas as minhas buscas, não fui capazde observar qualquer indício de vida animal. Descobri apenas uma aranha microscópica- uma apenas; esta estranha pioneira da renovação estava ocupada tecendo sua teia.
Um filhote de aranha? Como uma pequenina criatura sem asas poderia chegar tão rapidamente à ilha deserta? Os aracnólogos sabem que a maioria das espécies empreende "viagens de balão" em algum ponto do seu ciclo de vida. A aranha se coloca na borda de uma folha ou em algum outro local exposto e lança um fio de seda das fiandeiras na extremidade posterior do abdômen. O fio acaba sendo colhido por uma corrrente de ar e vai se esticando, puxado pelo vento, como a linha de uma pipa. A aranha vai tecendo mais e mais seda até que o fio exerce um forte puxão sobre ose u corpo. Ela então se solta da folha ou da relva e sai voando. Não apenas os filhotes minúsculos, mas também aranhas grandes, que por vezes atingem milhares de metros de altitude e viajam centenas de quilômetros antes de voltar ao chão para acomeçar uma vida nova. Ou então caem na água e morrem. As viajantes não têm controle algum sobre a sua descida.
As aranhas que empreendem essas viagens de balão são membros do que os ecologistas, numa dessas raras expressões felizes derivadas do grego e do latim, chamaram deliciosamente de plâncton eólico. Em linguagem comum, plâncton é a vasta multidão de algas e pequenos animais arrastada passivamente pelas correntes de água; eólico refere-se ao vento. As criaturas que compõem o plãncton eólico são dedicadas  quase interiramente à dispersão em longa distância. Podemos ver o plâncton eólico se formando em nossos jardins e arbustos numa tarde tranqüila de verão, quando os pulgões abrem suas asas delicadas e se erguem apenas o suficiente para serem levados pelo vento. Uma chuva de bactérias plânctônicas, esporos fúngicos, pequenas sementes, insetos, aranhas e outras minúsculas criaturas cai incessantemente sobre amaior parte da superfície terrestre. É uma chuva rala e difícil de detectar momento a momento, mas vai se acumulando perceptivelmente ao longo de semanas ou meses. Foi assim que amaioria das espécies colonizou o resquício carbonizado e cauterizado de Krakatau.
Muito raramente, uma tempestade violenta transforma animais maiores ( como lagartos ou rãs) em passageiros eólicos, arrastando-os para praias distantes. Trombas-d'águas podem pegar peixes e transportá-los vivos para lagos e rios das proximidades.

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