Os Bastidores do Projeto Genoma Humano

Prestes a completar 30 anos do seu lançamento em 1990, o Projeto Genoma Humano (PGH) guarda fatos e curiosidades que ainda são desconhecidos do grande público. O projeto foi dirigido inicialmente por James Watson e consistiu num esforço internacional para o mapeamento do genoma humano e a identificação de todos os nucleótideos que o compõem. A possibilidade de lucro com o patenteamento de regiões do genoma humano atraiu o interesse do cientista e empresário em biotecnologia  Craig Venter, que fundou em 1998 a empresa privada Celera Genomics. A Celera se comprometeu em sequenciar todo o genoma humano até 2001, contra o final então previsto pelo consórcio público para 2003. Com isso, iniciava-se uma rivalidade que serviu para alavancar o megaprojeto. Temendo um possível "loteamento" do genoma humano pela Celera, o PGH tomou por objetivo terminar seu trabalho antes da empresa privada. 



Prestes a completar 30 anos desde o seu lançamento em 1990, o Projeto Genoma Humano (PGH) guarda fatos e curiosidades que ainda são desconhecidos do grande público. O projeto foi dirigido inicialmente pelo bioquímico, zoólogo e geneticista James D. Watson, na época chefe dos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH, na sigla em inglês), e consistiu num esforço internacional para o mapeamento do genoma humano e a identificação de todos os nucleótideos que o compõem. Em 1990, o PGH tinha o envolvimento de mais de 5000 cientistas, de 250 diferentes laboratórios, que contavam com um financiamento de 3 milhões de dólares do Departamento de Energia dos Estados Unidos e do NIH estadunidense.O principal desafio do projeto era determinar o número de genes de um humano e quais são as sequências de DNA que codificam proteínas e que são responsáveis por nossas características hereditárias. 
Em 1992, James Watson se desentendeu com outros cientistas e o comando da pesquisa passou para o geneticista Francis Collins. A possibilidade de lucro com o patenteamento de regiões do genoma humano atraiu o interesse do cientista e empresário em biotecnologia John Craig Venter, que, em maio de 1998, anunciou a criação da empresa privada Celera Genomics. A Celera se comprometeu em sequenciar todo o genoma humano até 2001, contra o final então previsto pelo consórcio público para 2003. Utilizando uma tecnologia inovadora chamada WGS (Whole-Genome Shotgun), empregada com sucesso no sequenciamento do genoma da mosquinha-das- frutas Drosophila melanogaster, a Celera realizou o procedimento com o genoma humano em aproximadamente 13 meses.
O investimento da Celera deixou Collins e o consórcio internacional preocupados. Com isso, iniciava-se uma rivalidade que serviu para alavancar o megaprojeto. Temendo um possível "loteamento" do genoma humano pela Celera, o PGH tomou por objetivo terminar seu trabalho antes da empresa privada. 
Assim, em 2000 em uma cerimônia na Casa Branca, em que apresentaram um rascunho do genoma, os diretores dos dois grupos rivais, Francis Collins e J. Craig Venter, declararam uma vitória conjunta e anunciaram uma trégua implícita em suas corridas para decifrar o genoma humano
No livro "DNA: o segredo da vida" (2003), James Watson narra alguns episódios relacionados ao Projeto Genoma Humano que não são de conhecimentos do público em geral e que servem para revelar parte dos bastidores de um dos maiores empreendimentos da ciência moderna dos últimos tempos.

Tudo começou com um telescópio

No início dos anos 1980, astrônomos da Universidade da Califórnia propuseram a construção do maior e mais poderoso telescópio do mundo sob os auspícios da Fundação Max Hoffman, que havia prometido contribuir com 36 milhões de dólares do custo do projeto estimado em 75 milhões. A universidade agradecida concordou em dar o nome do generoso benfeitor ao projeto. Porém, essa decisão não foi benéfica para o projeto que empacou porque os outros possíveis doadores relutaram em investir num telescópio que trazia o nome de outrem. Depois, uma outra organização filantrópica muito mais rica, a Fundação W. M. Keck, resolveu financiar o projeto todo e a universidade, é claro, aceitou de bom grado. Não querendo ficar subalterna à Keck, a Fundação Hoffman retirou-se do projeto e os dirigentes da universidade pressentiram ali uma oportunidade de utilizar os 36 mil dólares da fundação em algum outro grande projeto.
Robert Sinsheimer, reitor do campus Santa Cruz e biólogo por formação, estava ansioso para ver a sua área de especialização fazer parte da primeira divisão das ciências bem remuneradas como a física e a astronomia que possuíam os seus projeto dispendiosos de aceleradores de partículas, satélites e telescópios de alto custo. Em maio de 1985 convocou uma conferência para discutir a ideia da criação de um instituto voltado ao sequenciamento do genoma humano. a princípio, a proposta pareceu ambiciosa demais e os participantes concordaram em direcionar os esforços para explorar regiões específicas do genoma que tivessem importância médica. Em resumo: no final, todas as discussões deram em nada, pois o dinheiro prometido pela Hoffman não veio e a semente do projeto genoma humano só foi germinar um ano depois no encontro de genética humana promovido por James Watson no laboratório Cold Spring.

Turbinando os "burros de carga" do projeto

Sem dúvida que o PGH foi beneficiado pelas inovações tecnológicas que foram surgindo concomitantemente ao desenvolvimento do projeto. Em última análise, o PGH não promoveu a invenção em grande escala de novos métodos para analisar DNA; pelo contrário, foram o aperfeiçoamento e a automatização de métodos já conhecidos que permitiram uma aceleração progressiva do sequenciamento. A descoberta da reação em cadeia de polimerase (PCR), por exemplo, foi crucial para o projeto. Segundo Watson, a automação do PCR se tornou um dos principais burros de carga do projeto. Com  a automação, o processo não dependia mais de legiões de universitários tresnoitados para realizar a exaustiva transferências de minúsculas quantidades de fluido para tubos de plásticos, pois um moderno laboratório de genômica possui linhas de produção controladas por robôs.
O próprio método de sequenciar DNA também foi turbinado com a mecanização do processo de sequenciamento. No início, o PGH usou o mesmo método desenvolvido por  Fred Sanger em meados dos anos de 1970. Posteriormente, o projeto foi alavancado pela utilização de máquinas de sequenciamento automatizado. Pelos padrões da época, com um mínimo de intervenção humana (cerca de 15 minutos a cada 24 horas), um sequenciador de última geração conseguia sequenciar até meio milhão de pares de bases por dia. 

Tudo ia bem, mas aí surgiu o tal de Venter

Diferente dos propósitos nobres do PGH, Craig Venter queria para si o melhor dos dois mundos: "continuar a integrar a comunidade acadêmica, onde as informações são compartilhadas livremente e os salários são baixos, e também ingressar na arena empresarial, onde suas descobertas deveriam permanecer secretas até que obtivessem as patentes necessárias e se pudesse começar a faturar", diz James Watson em seu livro. Não querendo perder um minuto sequer, ele logo fundou uma empresa que mais tarde viria a ser chamar Celera Genomics, cujo lema era: "Rapidez é tudo; as descobertas não podem esperar". O plano de Venter era sequenciar todo o genoma humano pelo método whole genome shotgun ( algo como "atirar a torto e a direito para acertar o genoma inteiro") usando trezentas máquinas de sequenciamento de última geração e a maior concentração de potência computacional fora do Pentágono. O projeto, que recebeu o nome de Projeto Genoma Humano privado (em oposição ao público) levaria dois anos para ser concluído e custaria entre 200 e 500 milhões de dólares. 
Numa conferência do PGH realizado nas ilhas Bermudas em 1996, da qual Venter participou, ficou acertado que a sequência do genoma deveria ser um bem público e que os dados sequenciados seriam divulgados tão logo fossem gerados. Porém, com a fundação da Celera, Venter tinha outras ideias: adiaria  a divulgação das novas sequências por 3 meses e afirmou que venderia licenças a laboratórios farmacêuticos ou a qualquer parte interessada em obter acesso antecipado aos dados. 
As acusações malcriadas entre os diretores dos projetos público e privado preencheram a seção científica dos jornais nos dois anos seguintes.  A troca de farpas chegou a tal ponto que o presidente Clinton orientou seu assessor científico: " Dê um jeito de fazer esses caras trabalharem juntos".
Enquanto a corrida entre os projetos público e privado chegava ao clímax na mídia, nos bastidores o interesse estava se voltando para o consórcio de cientistas destinados a montar a sequência final e decifrar o que era o que na sequência final e, sobretudo, onde estavam os genes. A data para completar (e montar) um "rascunho" do genoma já estava fixada: 26 de junho. 
Assim, no dia 26 de junho de 2000, Bill Clinton, na casa Branca, e Tony Blair, em Downing Street, anunciaram simultaneamente a conclusão do Projeto Genoma Humano. Porém, o sequenciamento estava longe de terminar e somente 6 meses depois os periódicos científicos começariam a publicar sumários do genoma. 
Para saber mais mais, clique nos links acima

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A Mariposa da Morte

Ilustrações da Mitose

Saiba Mais Sobre a Vitória-Régia