Perdendo a Guerra Para os Microrganismos

A Guerra Civil Americana matou mais gente de doença do que em batalha. O vírus da gripe na pandemia de 1918 matou três vezes mais em um quarto do tempo que durou a Primeira Guerra Mundial. A história da humanidade e suas guerras pode ser recontada do ponto de vista da infectologia, posto que em muitos combates os microrganismos infecciosos foram os verdadeiros vencedores do conflito, sem distinção de bandeiras ou divisas. O livro 'A Assustadora História da Medicina" de Richard Gordon (1921-2017) tem um capítulo que conta como a humanidade perdeu as guerras contra os microrganismos, literalmente.


Do ponto de vista histórico, o título dessa postagem bem que poderia ser considerado literalmente. A história da humanidade e suas guerras pode ser recontada do ponto de vista da infectologia, posto que em muitos combates os microrganismos foram os verdadeiros vencedores do conflito, sem distinção de bandeiras ou divisas. Aproveitei esse momento em que está se falando bastante sobre a pandemia de coronavírus que assombra o mundo para reeditar uma postagem de 2015 que traz trechos do livro 'A Assustadora História da Medicina" de Richard Gordon (1921-2017). Gordon foi um cirurgião e anestesista inglês que escreveu vários romances, roteiros para cinema e televisão e relatos da história popular, lidando principalmente com a prática da medicina. Nesse livro, Gordon faz um estudo divertido e sarcástico sobre o desenvolvimento da ciência médica ao longo dos últimos quatro séculos e dá provas que o empirismo e o experimentalismo marcaram descobertas importantes da medicina que são comuns hoje em dia.
A postagem que fiz em 2015 recebeu o título de  "As Guerras Que os Microrganismos Venceram" foi extraída de um capítulo do livro de Gordon sobre a história da humanidade e os microrganismos. Apesar de o título parecer um tanto pessimista, não estou menosprezando os esforços feitos por pesquisadores do mundo inteiro para debelar as infecções microbianas que volta e meia assombram a humanidade. A postagem também pode ser vista como um alerta para a necessidade de se fazer cada vez mais investimentos nas pesquisas dessa área se realmente pretendemos ganhar a guerra contra os agentes infecciosos. Vamos ao texto.

"A guerra da África do Sul (1899-1902) não foi ganha com os antiquados rifles dos fazendeiros bôeres, mas pelo bacilo da febre tifóide. Em cada grupo de mil soldados enviados para a Cidade do Cabo pelo Império Britânico, a febre tifóide matou 15, duas vezes mais do que conseguiu o inimigo. 
Em 430 a.C, o tifo em Atenas já havia complicado bastante a Guerra do Peloponeso. Em Antioquia, em 1098, o tifo e o a disenteria dizimaram os cruzados, homens e cavalos. O medo generalizado da infecção fez maravilhas quanto ao índice de conversão ao cristianismo, especialmente porque o único recurso da saúde pública era o exorcismo. Durante a Guerra dos 30 Anos, os dois lados posicionaram-se para a batalha de Nurembergue, em 1632, mas o tifo matou antes de a luta começar que tiveram de desistir.
O tifo atormentou os cavaleiros do rei Carlos, em Oxford, e em 1741 capturou Praga para Luís XV. Junto com o General Inverno, o tifo e a disenteria conseguiram a retirada dos franceses de Moscou. Lênin perdeu 3 milhões de novos camaradas com tifo, em 1918-1922. O tifo reforçou as selvagerias da II Guerra Mundial nos campos de concentração, nos acampamentos de refugiados e nos postos do exército, embora os aliados tenham derrotado o piolho antes dos nazistas, acabando com a epidemia em Nápoles, em 1944, usando o inseticida DDT.
O tifo exantemático, uma infecção provocado pelo microrganismo chamado Rickettsia prowazeki, no início do século 20 era uma doença súbita e devastadora com um índice de mortalidade de 20%. Transmitida por piolhos infectados, o tifo era uma consequência da guerra, da promiscuidade, da falta de água, de roupas limpas e material de limpeza.
Já a peste negra, transmitida pela pulga do rato, também dizimou grande parte da Europa. Causada pelo microrganismo batizado de Pasteurella pestis, esta terrível doença começou nas praias do montanhoso lago Issik-Kul, a leste do mar de Aral, além de Tashkent, no canto entre a Rússia e a China, ao norte do Himalaia. Enquanto estava matando indianos, armênios, tártaros e curdos, a peste não era uma problema de saúde pública, mas quanto chegou à Europa em 1348, assumiu caráter alarmante e nada mais podia contê-la. Em covas abertas eram enterrados apressadamente os corpos putrefatos, malcheirosos e ameaçadores das vítimas, totalizando 25 milhões de mortos na Europa, aproximadamente um quarto da população.
A doença foi chamada de peste negra porque os mortos ficavam pretos. Sangravam horrivelmente ao nível da pele. Havia dois tipos de peste: a bubônica e a pneumônica, transmitida pela respiração, como uma pneumonia hemorrágica, com morte certa e rápida.
A Guerra Civil Americana, não por acaso, matou mais gente de doença do que em batalha, diz a historiadora Keila Grinberg da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UniRio). E os mais afetados foram os afrodescendentes, que só então haviam deixado de ser escravos. Estima-se que, do fim da guerra, em 1865, a 1869, cerca de um milhão de libertos contraiu varíola, febre amarela ou disenteria.
No século 20, a pandemia de gripe de 1918 matou 0,5 % da Grã-Bretanha e dos EUA e 25 milhões de pessoas no mundo todo. A guerra, havia pouco terminado, matara aproximada 8,5 milhões de soldados. Portanto, o vírus da gripe matou três vezes mais em um quarto do tempo que durou a Primeira Guerra Mundial. 
Nada cura a gripe. Porém, hoje, os antibióticos podem evitar a pneumonia, assim como pode deter o tifo, a disenteria e a peste bubônica. Os microrganismos têm perdido algumas batalhas, quanto à guerra..."
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