Devemos Acreditar na Ciência?



Através do estudo da história da ciência, os alunos poderiam aprimorar a compreensão de suas próprias motivações para acreditar na ciência e vê-la como um método de conhecimento.

Em uma pesquisa realizada pela Fundação Nacional da Ciência dos Estados Unidos (NSF, na sigla em inglês) em 2008, um número maior de entrevistados expressou ter “mais confiança” em autoridades científicas que em líderes de qualquer outra instituição, exceto o exército. Em questões de políticas públicas, os americanos julgam a liderança científica mais bem informada e imparcial que as chefias de outros setores da sociedade, como o empresariado ou o governo. Por que os pacientes afirmam confiar em cientistas de modo geral, mas se distanciam deles em questões específicas?
Muitos culpam a má qualidade da educação científica nos Estados Unidos. O pensamento corrente é: se as crianças aprendessem mais ciências na escola saberiam valorizar a opinião científica sobre vacinas, clima, evolução e outros assuntos de cunho político. Mas esse conceito é equivocado. Pacientes dotados de maior conhecimento científico têm apenas uma propensão ligeiramente maior para confiar nos cientistas. A ciência subjacente a muitas questões políticas é altamente especializada e sua avaliação exige profundo conhecimento – um entendimento muito maior do que os alunos acumularão em aulas de ciências no ensino fundamental e médio. Uma abordagem mais direta seria esclarecer o porquê de eles tenderem a aceitar crenças imprecisas em primeiro lugar.
Os seres humanos parecem valorizar a precisão acima de tudo. Queremos que nossas convicções sejam corretas – em conformidade com o que é realmente verdadeiro a respeito do mundo – e sabemos que a ciência é um guia confiável para isso. Entretanto, esse desejo de exatidão se choca com outros motivos; alguns deles inconscientes. Por exemplo, as pessoas têm convicções para proteger valores importantes. Quem considera a Natureza “sagrada” pode entender a modificação genética como algo moralmente errado, independentemente de sua segurança ou utilidade. Além disso, elas se atêm a crenças enraizadas em suas emoções.
Ao conciliarmos nossos motivos racionais e irracionais para acreditar, tornamo--nos mestres em nos autoenganar. Como pretendemos ser seres racionais, encontramos razões para insistir em que nossas convicções são de fato verdadeiras. Uma ou duas opiniões divergentes bastam para nos convencer de que a ciência é “controversa” ou “instável”. Se as pessoas soubessem que outros motivos podem com-prometer a exatidão de suas certezas, a maioria provavelmente tentaria manter-se vigilante.
Exigir que professores de ciências transmitam informações suficientes para a compreensão de todas essas questões talvez não seja uma atitude realista, mas eles poderiam ajudar a sensibilizar a sociedade para o conhecimento científico. Através do estudo da história da ciência, os alunos poderiam aprimorar a compreen-são de suas próprias motivações para acreditar na ciência e vê-la como um método de conhecimento. Se um estudante entender como a visão de mundo medieval pode ter feito com que a teoria de um Sistema Solar geocêntrico parecesse correta, faltará pouco para que ele detecte influências similares em si mesmo.
A história da ciência também pode ajudar os alunos a compreender por que o conhecimento científico se torna cada vez mais preciso. É fácil para um leigo descartar uma conclusão desagradável como controversa com base no argumento de que os cientistas mudam constantemente de opinião: “Primeiro eles afirmam que o chocolate faz mal, depois dizem que é benéfico... eles não conseguem decidir nada”. Mas, ao estudarem como novas observações levaram à revisão de teorias importantes, os estudantes aprendem que a ciência não trata de leis imutáveis, mas de explicações temporárias, que são revisadas assim que surge outra melhor. Eles também compreendem que a prontidão dos cientistas para mudar suas convicções de acordo com os dados é uma fonte de grande força, não de fraqueza; e por que a quase unanimidade de opiniões sobre questões como o aquecimento global ou a segurança das vacinas é tão impressionante. A ciência pode não ser a única maneira de organizarmos e compreendermos nossas experiências; mas em termos de precisão ela é muito melhor que a religião, a política e a arte. Essa é a lição.

Por Daniel T. Willingham, professor de psicologia da University of Virginia e autor de Why don't students like school? (Jossey-Bass, 2009). Adaptado de Scientific American Brasil  ed.115

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