Bebês Digitais

Tecnologia brasileira permite criação de réplicas tridimensionais de fetos e passeios virtuais por dentro de seus órgãos antes do nascimento. A técnica ajuda médicos a planejar o tratamento de má formações, além de fazer a alegria de pais e mães.

Desde a invenção da ultrassonografia, pais e médicos não precisam esperar nove meses para saber o sexo, ver o rosto do bebê e detectar problemas de formação. Agora, uma tecnologia desenvolvida por brasileiros promete avançar ainda mais o diagnóstico por imagem dos fetos ao possibilitar a navegação virtual por dentro de seus órgãos e a impressão de réplicas quase perfeitas de seus corpinhos. 
A equipe responsável pela tecnologia é composta por médicos e designers da empresa Tecnologia Humana, incubada no Instituto Nacional de Tecnologia (INT). O grande pulo do gato foi criar uma maneira de extrair a informação digital dos aparelhos de ultrassom 3D – que só geram uma imagem chapada com impressão de tridimensionalidade – e trabalhá-la em programas de edição de imagens em 3D.
Nesses programas, os pesquisadores conseguem refinar a imagem da ultrassonografia, retirando digitalmente o que não interessa – como a parede do útero e o cordão umbilical que estiver encobrindo a face do bebê – e obter uma réplica digital do feto.
A tomografia não poderia ser usada para visualizar os bebês, pois produz radiação que pode fazer mal a eles. Por isso os pesquisadores escolheram a ultrassonografia. Nesse exame, a imagem do bebê é composta a partir da junção de fatias de imagem de 4 milímetros (mm) cada, como se fossem camadas que, empilhadas, formam um bolo. A ideia veio de um trabalho anterior feito pelos pesquisadores no Museu Nacional, no Rio de Janeiro, onde usavam tomografia computadorizada para escanear e explorar o interior de objetos do acervo, como fósseis e múmias. “Se a gente conseguia ver por dentro de sarcófagos, retirar digitalmente as ataduras das múmias, por que não trabalhar essa técnica para ver os fetos por dentro do útero da mãe?”, conta o médico especializado em medicina fetal Heron Werner.
Essas camadas, no entanto, são muito grossas para criar uma imagem tridimensional manipulável bem definida. Os pesquisadores, então, com a ajuda de engenheiros, conseguiram refinar as fatias de imagem do aparelho para 1mm.
Com o domínio dessa técnica, eles conseguiram imagens bem definidas e começaram a imprimir réplicas dos bebês em impressoras 3D. Os modelos, em acrílico ou gesso, além de fazer a alegria das mães, foram pensados, a princípio, para ajudar na comunicação entre os médicos sobre problemas no feto. 
“Nossa ideia inicial era imprimir esses fetos para estudo”, diz Werner. “Muitas vezes eu queria discutir com o pediatra ou o cirurgião sobre a patologia de um bebê mostrando a imagem do ultrassom tradicional, mas eles não estão acostumados com essas imagens e pensei que nada poderia ser melhor do que realmente colocar o feto na mão deles para que tivessem uma visão melhor do problema.”

Além da impressão do feto, os próprios arquivos digitais do bebê em 3D podem auxiliar os médicos a tratar dos casos de má formação. Recentemente, as versões virtuais das vias respiratórias de quatro bebês com tumores no pescoço – feitas com ressonância magnética em vez de ultrassom – foram usadas por cirurgiões para analisar em detalhes a gravidade do problema e preparar os procedimentos cirúrgicos. 
“Nossa tecnologia permite ver o grau de invasão do tumor, saber se ele está obstruindo as vias aéreas ou não, uma informação superimportante para guiar a conduta do cirurgião na hora do nascimento e garantir a sobrevivência do neném”, diz Werner.
A mesma técnica também já é usada para criar um passeio virtual por dentro do útero. Com esse arquivo digital, médicos podem ensaiar certos tipos complexos de cirurgia feitos antes do nascimento.
Um exemplo é quando, em uma gestação de gêmeos, os fetos dividem a placenta e alguns vasos sanguíneos de modo que um deles recebe mais sangue que o outro. Nesses casos, é preciso fazer uma fetoscopia com uma fibra ótica que tem na ponta uma câmera e um laser para cauterizar o vaso e interromper o fluxo sanguíneo defeituoso. 
“É uma cirurgia muito delicada e com esse passeio virtual o cirurgião tem possibilidade de treinar antes, de ver tudo o que ele vai enfrentar pela frente no dia da cirurgia”, diz Werner. 
A impressão dos bebês também tem sido útil para mães e pais cegos. Sem poder acompanhar o ultrassom tradicional, eles agora podem sentir em suas mãos o corpo dos filhos. “A reposta dos pacientes tem sido emocionante”, conta o médico. “Eles podem tocar o rosto do neném e ter a mesma percepção que uma gestante que enxerga. Antes, eles só contavam com uma narração do exame.”
O médico afirma que, por enquanto, é o único no mundo que usa a técnica. Na clínica em que trabalha, reserva quatro horários por semana para atender gratuitamente mães com fetos que tenham má formação. Para receber os pais cegos, trabalha em parceria com o Instituto Benjamin Constant.
O designer Jorge Lopes, um dos fundadores da empresa, conta que pretende difundir a tecnologia entre mais médicos. Para isso, sua equipe tem trabalhado na elaboração de um programa de computador capaz de automatizar a criação da imagem em 3D. “Todos os bebês que tiveram a oportunidade de ter o prognóstico avaliado com o uso da nossa técnica hoje estão bem e queremos expandir isso para todos”, diz. 
Veja como é feita a impressão da réplica de um bebê em uma impressora 3D:


Fonte: Revista Ciência Hoje On-Line

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