O Matemático Paul Lévy e a Biologia


O matemático francês Paul Lévy (1886-1971) elaborou um modelo matemático que explica o padrão de movimento que os animais utilizam para conseguir alimento. O chamado passeio de Lévy já serviu de base para se entender muitos outros fenômenos dentro da biologia

Todos os animais repetem o mesmo padrão quando estão atrás de comida ou quando exploram o ambiente por algum motivo: eles se movimentam de um jeito a lembrar um passeio de Lévy, um tipo de passeio aleatório cujo nome é uma homenagem ao matemático francês Paul Pierre Lévy (1886-1971). De acordo com a tese do matemático francês, também conhecida como "voo de Lévy", quando uma fonte de alimento está distribuída de maneira esparsa e aleatória, a estratégia mais proveitosa para um animal em busca de uma refeição é, nesses casos, fazer grandes jornadas e depois ciscar em pequenos movimentos e por um tempo para vasculhar os arredores. Se não encontrar mais nada, é voar para outra zona distante onde a probabilidade de encontrar novo alimento talvez seja maior.
Para entender esse padrão temos que imaginar uma gaivota que busca alimento. Podemos imaginá-la na orla marítima, caçando caranguejos, e ali permanecendo durante horas. Até que a maré muda. Então, é possível que a gaivota vá a outro local em busca de mais alimento.
Suponhamos que essa gaivota esteja em uma região de grande oferta de alimento, mas por um determinado motivo ocorre a escassez, então há necessidade de procura, ocorre movimento, alimento encontrado, então ocorre um estacionamento, novamente acaba o alimento, nova procura, seguindo este raciocínio o alimento muitas vezes estará próximo, mas ocorrerá um momento em que o movimento terá que percorrer um caminho maior,
De acordo com os epidemiologistas, este padrão de muitos voos curtos que se alternam com poucos voos compridos é o modo como, atualmente, se propagam as enfermidades entre as pessoas. Antes não era assím. Por exemplo, na Europa do século XIV, a peste não se propagava muito rapidamente, de uma cidade a outra, porque as pessoas não conseguiam se deslocar mais do que alguns quilômetros por dia. As pessoas apenas interagiam com aquelas que viviam nas proximidades.
Calcula-se que, naquele tempo, uma praga levava mais de 3 anos para se deslocar do sul da Europa às regiões setentrionais, a uma velocidade de 4 a 5 quilômetros por dia, tal como informa o estudo de,  S. Scott e C. Duncan, Biology of Plagues: Evidence from Historial Populations.
Agora comparemos essa forma de propagação com a de uma nova enfermidade, surgida em 2003, a pneumonia asiática ou Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS, em inglês). Devido a que as pessoas hoje em dia se deslocam muito mais, fazendo viagens de longas distâncias inclusive, e com isso aumentam a propagação dos agentes patógenos, é que se pôde comprovar o seguinte:
Um dos afetados pela epidemia de SARS transportou a infecção por quase 13.000 quilômetros (da China ao Canadá) em somente 24 horas. Sem dúvida um voo de Lévy de funestas consequências.
Para o antropólogo estadunidense David Raichlen, se tubarões, raposas, lobos, abelhas, formigas e homens exploram o ambiente em passeios de Lévy, é porque todos os animais têm algo em comum. No mínimo , é bem possível que o mecanismo de modificação das espécies por seleção natural tenha favorecido as espécies que usam os passeios de Lévy.
David e seus colegas da Universidade do Arizona entraram em contato om uma das poucas tribos que ainda vivem como caçadores-coletores sem o apoio de uma tecnologia recente, o povo Hadza. Os pesquisadores conseguiram convencer os membros do povo Hadza a usar localizadores por GPS no pulso. Depois de um uns meses, David colocou os dados num computador e os analisou: o modelo matemático que melhor descreve o modo como o povo Hadza se movimenta é feito com passeios de Lévy.
Os cientistas já sabiam que o homem usava os passeios de Lévy no mundo civilizado. Uma pessoa acorda, vai para o trabalho (longe), anda em torno do escritório (perto), vai no fim do dia para a faculdade (longe), anda em torno da faculdade (perto), vai para casa (longe), anda pelo bairro (perto).
Os passeios aleatórios de Lévy são, na realidade, um dos muitos exemplos de uma cadeia de Markov, processo do campo matemático da probabilidade e estatística, sendo um caso particular de processo estocástico com estado discreto. As cadeias de Markov foram descritas pela primeira vez em 1906 pelo matemático russo Andrei Andreyevich Markov. É difícil achar um cientista que nunca tenha usado uma cadeia de Markov em suas pesquisas.
Para saber mais:

Fonte: Revista Cálculo, edição 37, fevereiro de 2014.

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