Insetos Com Órgãos Sexuais Invertidos


Pesquisador da  Universidade Federal de Lavras (MG)  descobre fêmea de inseto com pênis. Pesquisador descobriu também que a fêmea penetra o macho. Troca inédita de papéis poderá aprofundar estudos sobre a evolução sexual dos insetos e demais invertebrados

Um artigo publicado, na semana passada, na revista especializada Current Biology, no qual uma equipe formada por um cientista brasileiro, da Universidade Federal de Lavras (UFla), dois japoneses e um suíço descreveram quatro espécies de insetos de cavernas cujas fêmeas têm pênis, e os machos, vagina, causou rebuliço no mundo científico. Esse é o primeiro caso de animais com órgãos sexuais invertidos registrado pela ciência, um fenômeno que pode mudar a forma como os especialistas estudam a evolução animal.
Os pequenos animais medem menos de 4mm e haviam sido descobertos há 18 anos, no Norte de Minas Gerais. A genitália inusitada dos animais, no entanto, manteve-se um mistério até que o pesquisador brasileiro Rodrigo Ferreira encontrou espécimes parecidos em cavernas na caatinga brasileira. Como os insetos eram similares, mas não pareciam ser da mesma espécie, Ferreira decidiu enviar os bichos para Genebra, onde um especialista na ordem Psocoptera poderia descobrir se eles eram relacionados.
De acordo com a teoria de Kazunori Yoshizawa, da Escola de Agricultura da Universidade de Hokkaido, a origem da inversão sexual pode estar no ambiente precário em que os insetos brasileiros vivem. Todos eles foram encontrados em cavernas secas, onde a única fonte de alimento disponível são carcaças e fezes de morcegos. “É de conhecimento geral que, em ambientes onde a comida é escassa, o material seminal estimula fêmeas a copular com mais frequência. Como resultado, isso causa uma competição sexual entre fêmeas por esse material”, ensina o especialista em seleção sexual.
Acredita-se que a falta de nutrientes tenha tornado o macho mais seletivo em relação a suas parceiras, obrigando a fêmea a passar por uma mudança ao longo de milhares de anos. Para sobreviver, elas tiveram de desenvolver a genitália até obter uma ferramenta mais eficiente de coerção sexual: o ginossoma. As quatro espécies do gênero Neotrogla (Neotrogla curvata, N. aurora, N. truncata e N. brasiliensis) desenvolveram órgãos de formato um pouco diferente, mas com a mesma função: depois que as fêmeas penetram os machos para ter acesso ao duto seminal, os pênis incham, engatando um conjunto de espinhos na base do órgão que fixam os insetos nessa posição.
Em contrapartida, os machos tiveram de adaptar o órgão sexual para uma forma mais simples, como um fino arco. Para evitar ferimentos durante a cópula, eles chegaram a desenvolver bolsas feitas para abrigar os ganchos da fêmea – com exceção do Neotrogla truncata, cujo ginossoma é coberto por vários desses pequenos espinhos. De qualquer forma, a relação sexual entre esses bichos não parece precisar do consentimento do macho, que acaba dominado pela fêmea até que ela consiga o que quer. “A longa cópula deve ser custosa para machos, mesmo sem a transferência do esperma. Então, eles devem, em algum momento, decidir fornecer mais nutrientes para a fêmea mesmo sem chances de fertilização”, diz Yoshizawa.
Ao contrário do que se pode pensar, o gênero animal não é definido pela genitália. O fator determinante está nos gametas, que são maiores nas fêmeas do que nos machos. Mesmo tendo um pênis, a Neotrogla mantém a feminilidade definida pela dimensão das células reprodutivas e pela presença de um órgão chamado ovopositor, que tem a função de colocar ovos. “Batendo o olho, sabíamos que era uma fêmea antes da dissecação, pois vimos que tinha a estrutura (o ovopositor)”, conta Rodrigo Ferreira.
Os cientistas acreditam que a descoberta seja uma oportunidade para entender melhor a seleção sexual, o conflito entre os sexos e a evolução animal. Atualmente, eles estão cultivando uma população desses bichos em laboratório para registrar com detalhes a cópula e outros hábitos e, então, testar as atuais hipóteses sobre o processo de evolução único desse gênero.

Veja aqui o artigo original na Current Biology 

Fonte: EM (com adaptações)

Comentários

  1. Fanstástico. O que as pessoas talvez não percebam é a riqueza que existe nessas descobertas, nessas teorias e em artigos bacanas como o seu. Entre tanta utilidade, uma delas é a gente poder comparar e compreender o nosso próprio comportamento a partir da evolução da nossa dinâmica sexual. Os porquês começam a ficar claros e a gente passa a se compreender e a compreender o próximo... Muito bom!

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